sexta-feira, 9 de julho de 2010

Álcool é uma das principais causas de acidentes no trânsito

O trânsito brasileiro pode ser comparado a uma guerra, pela quantidade de mortos e feridos que produz. E pior, a maioria dos acidentes é provocada por 'fogo amigo': é o motorista que atira contra o próprio patrimônio — no caso, ele mesmo, amigos e familiares — ingerindo bebidas alcoólicas ou usando drogas antes de dirigir.
Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro, feita em parceria com o hospital Miguel Couto, levantou que cerca de 30% das vítimas de acidentes de carro que deram entrada no hospital tinham bebido ou se drogado.
Pela mesma pesquisa, usada como referência por aquele hospital, nada menos que 55% de todos acidentes com carros provocados por bebidas ou drogas aconteceram nas noites de sexta-feira, sábado e domingo.
É possível concluir que os acidentes ocorrem com mais freqüência quando as pessoas saem de bares, festas ou boates, mas o difícil é transformar o resultado final em números. Não há no país grandes estatísticas sobre vítimas de acidentes de trânsito. Desta forma, é impossível levantar o número real de mortos e feridos por causa da associação de álcool ou drogas com automóveis.
'É uma epidemia e não há dados concretos. A polícia, por exemplo, só costuma computar a morte provocada por acidente de trânsito quando ela acontece no local. Se ocorrer depois, não é registrada como conseqüência do acidente', explica o médico Dirceu Rodrigues Alves, da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet).
A embriaguez é a principal causadora de acidentes de automóveis apontada pelos médicos. Eles estimam que, para cada pessoa que é atendida por causa de acidentes de trânsito, três nem chegam aos hospitais. Isso porque não se machucaram, tiveram lesões leves ou, simplesmente, morreram no local.
'E, como os acidentes por causa de bebidas ou drogas costumam ser muito violentos, dois de cada dez pacientes que são atendidos têm lesões irreversíveis, mesmo passando por trabalhos de reabilitação', diz o médico Edson Paixão, diretor do hospital Miguel Couto.
O álcool provoca três estados mentais bastante distintos: euforia, confusão e depressão. Após as primeiras doses, o motorista se sente todo-poderoso. Eufórica, a pessoa perde o medo e o bom senso. Fica confiante, pisa fundo no acelerador e faz manobras ousadas.
O estágio seguinte é marcado pela confusão mental, que reduz o raciocínio e os reflexos. Por fim, o motorista embriagado entra em depressão, fica desatento e cansado, podendo até dormir. 'É a fase na qual ocorre a maioria dos acidentes. Sonolento, o motorista perde a capacidade de reação', afirma Alves.
Tudo isso pode acontecer com uma pessoa que tenha no organismo cerca de 0,6 mg de álcool por litro de sangue. Isso equivale a uma pessoa de 70 quilos consumir três latas de cerveja ou três doses de uísque. Mas é só um exemplo médio, que varia de acordo com a massa corporal, a sensibilidade ao álcool e até o estado emocional de cada um. Assim, o recomendado pelos médicos é não beber antes de dirigir.
Falta de instrumentos dificulta fiscalização
Dirigir sob o efeito de bebidas alcoólicas é considerada uma falta gravíssima, o motorista leva sete pontos no prontuário e ainda precisa pagar multa de até R$ 957. Mas tirar os ébrios das ruas não é fácil: enquanto sobram pardais e armadilhas para multar quem anda em alta velocidade, os bafômetros ainda são peças raras nas mãos da fiscalização. Assim, só mesmo um exame de sangue pode dar o resultado exato.
Nos centros urbanos, os acidentes provocados pela ingestão de bebidas alcoólicas são causados principalmente por motoristas particulares. Já em estradas, são os ditos profissionais, principalmente caminhoneiros, que provocam mais desastres. Nesse caso, o efeito do álcool costuma ser potencializado pela mistura com anfetaminas (um coquetel batizado de rebite).
O rebite é usado como um estimulante. Ele evita que o motorista sinta sono. Mas quando o efeito passa, todo o cansaço aparece rapidamente e, normalmente, o motorista acaba dormindo. 'É como um interruptor: ela liga, mas também desliga o condutor', conta Paixão.
Como não há estatísticas nem para medir o número de motoristas que dirigem alcoolizados, é ainda mais raro saber quantos comandam um automóvel sob o efeito de drogas. Mas, muitas vezes, elas acabam sendo associadas também com álcool, ficando mais potentes.
A cocaína age com mais intensidade do que o álcool e, segundo os médicos, só costuma ter duas fases: euforia e depressão. Já outras drogas, como a maconha, crack e ecstasy, provocam mais confusão mental, prejudicando os reflexos e o senso de orientação.
Essa guerra do trânsito mata principalmente os jovens. Os estilhaços, porém, atingem gente de todas as idades. 'Como a maioria dos mortos e feridos em acidentes provocados por álcool e drogas tem entre 20 e 39 anos, as famílias acabam sofrendo muito. Os pais, filhos e parentes se transformam em vítimas', diz o médico Edson Paixão.

Fonte: Época