segunda-feira, 4 de julho de 2011

Entra em vigor lei que amplia fiança e restringe preventiva


Agora é pra valer. A partir de amanhã, dia de 5 de julho de 2011, passa a vigorar no Brasil a nova lei que altera o Código de Processo Penal (CPP), instituído no dia 3 de outubro de 1941. A legislação que chega para mudar os critérios da prisão preventiva e dar maior amplitude à concessão da fiança, é motivo de expectativa e apreensão entre os operadores do Direito, especialmente os chamados advogados ´penalistas´ .

O Diário do Nordeste, que já havia antecipadamente tratado a questão, foi ouvir o que dizem os especialistas sobre a nova legislação. "É forçoso reconhecer que a nova lei inova ao exigir maior cautela e prudência quando da aplicação da prisão preventiva, considerando-a como uma medida absolutamente excepcional", destaca o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção do Ceará (OAB-CE), Valdetário Andrade Monteiro.

Fiança

A inovação que o presidente da seccional cearense da OAB ressalta, vem misturada a um sentimento de cautela. Não é para menos. Com as alterações, mais de uma centena de crimes previstos no Código Penal, punidos com até quatro anos de reclusão, passam a ser afiançáveis.

Delitos como homicídio culposo (quando não há intenção de matar), aborto provocado pela gestante ou com o seu consentimento, cárcere privado e sequestro, extorsão indireta, furto simples, dano qualificado, receptação, violação de direito autoral (´pirataria´ de obras artísticas como filmes e músicas), vilipêndio de cadáver, arrebatamento de preso, falso testemunho, fraude processual, falsificação de medicamentos e até formação de quadrilha, passarão a ser afiançáveis.

Com isto, quem for primário perante a Justiça (não tiver condenação definitiva), mesmo que cometa algum dos crimes citados anteriormente, sendo preso em flagrante, pagará fiança ainda na delegacia de Polícia e será, imediatamente, solto.

"Seria precipitado quantificar quantos presos seriam alcançados imediatamente com a concessão de fiança e, consequentemente, devolvidos à liberdade. Mas, o certo é que a lei parece não disfarçar que o Poder Público admite a ineficiência do atual sistema penitenciário, que se apresenta superpopuloso, com déficit de 110 mil vagas, e ocupando a quarta colocação entre os países que mais aprisionam", diz Monteiro.

Entre os especialistas no Direito Penal, uma opinião é unânime, a lei veio para servir como paliativo à grave crise do Sistema Penitenciário. "Neste momento, ela traz mais expectativa do que efeitos práticos", arremata o presidente da OAB.

CADEIAS LOTADAS

Para Vasques, "o Sistema fracassou"

Criminalista afirma que "a nova lei traduz silenciosa confissão do Estado de que o Sistema Penitenciário faliu"

Com uma população carcerária superior a 16 mil presos, o Estado do Ceará, como de resto todo o Brasil, sofre com a grave situação de superlotação de suas unidades penitenciárias, sejam aquelas destinadas aos condenados, ou as que abrigam os presos provisórios, isto é, que aguardam julgamento ou cumprem preventiva. Com as mudanças no CPP, é possível que a situação seja amenizada.

Para o criminalista Leandro Vasques, mestre em Direito, ex-presidente do Conselho Penitenciário do Estado, professor de Direito e atual presidente da Caixa de Assistência ao Advogado do Estado do Ceará (Caace), o texto da legislação que entra em vigor nesta terça-feira, "apesar de alguma evolução, traduz uma confissão tácita e silenciosa do Estado de que o superpopuloso Sistema Penitenciário faliu e fracassou completamente em sua finalidade".

Porém, ressalta que o dispositivo também sugere "a criação de novas alternativas ao cárcere". E cita o elenco das medidas cautelares previstas na lei, como a prisão domiciliar e o monitoramento eletrônico de presos.

"O artigo 282 do Código de Processo Penal, com sua nova redação, criará balizas para a aplicação das medidas cautelares, impondo a observância de parâmetros razoáveis e proporcionais para a eventual constrição da liberdade".

Fiança

Sobre a ampliação do raio da fiança, Vasques adverte, ainda, que, deverá a autoridade policial ter bastante cautela no exercício do arbitramento.

"A lotação dos xadrezes (das delegacias de Polícia) não deve, de modo algum, servir de único alicerce para o afiançamento. Também outros aspectos devem ser levados em conta", diz o mestre em Direito. Ele ressalta como importante, por exemplo, a ´positivação´ da prisão domiciliar no Brasil.

REFLEXÃO

Quezado diz que haverá "mudança de mentalidade"

O advogado cearense Paulo Quezado, um dos mais renomados criminalistas brasileiros, acredita que as mudanças advindas da lei 12.403/11 irão representar "uma mudança de mentalidade dos operadores do Direito, com reflexos positivos na redução do quadro de superlotação do sistema carcerário brasileiro", adverte.

Segundo ele, dos mais de 16 mil detentos que se encontram nos estabelecimentos penais do Ceará, conforme relatório da Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus), metade deles são provisórios. "Muitos poderiam estar em liberdade, mas continuam sob a custódia do Estado antes mesmo do trânsito em julgado (sentença definitiva) da ação penal, levando a uma superpopulação nas unidades prisionais e delegacias de Polícia e, ainda, obrigando o Estado a construir, quase todos os anos, novas unidades de detenção provisória", alerta Quezado.

Para o especialista, a nova lei, além de "evitar o encarceramento antecipado e desnecessário, traz novas regras para a prisão processual, fiança, liberdade provisória e medidas cautelares alternativas".

"Agora, ninguém mais poderá responder preso a processo em virtude de prisão em flagrante, devendo o magistrado, ao ser comunicado do ato, relaxar a prisão ilegal, conceder a liberdade provisória com ou sem fiança, podendo, quando necessário, estabelecer medidas cautelares diversas da prisão, ou, em último caso, converter o flagrante em prisão preventiva, ressaltando-se aqui, a necessidade da presença dos requisitos estabelecidos no artigo 312 do Código de Ritos Criminais", explica Paulo Quezado.

Entre as nove medidas cautelares, ele cita o comparecimento periódico em Juízo, proibição de acesso a determinados lugares, recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga, suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira, internação provisória, fiança (quando cabível), e o monitoramento eletrônico.

Fonte: Diario do Nordeste